quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Poema 3

Uivando pro muro, espero sinal do concreto
-
completo do repleto, daquele tempo vil, seleto...

Um vento se interpõe
                  passa raso,

      esclarece,
                   Recrudesce.

Tem tijolo bambo em muro firme
e a gravidade do acaso
eriça um galo
em meia
missa.

- Ô, mané! Me desce outra!

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Cotidiano 2


    Fábio, que sabia o seu nome ser Fábio, estava parado no cruzamento aguardando o verde do farol, cor que conhecia sob o significado da permissão da travessia, resultante do impedimento do movimento que com ele cruzava, o qual se encerrava no signo do vermelho. Ele não sabia juntar os signos alfabéticos e compreender os significados daí construídos, mas sabia compreender os significados dos signos oferecidos pelo cotidiano. Tinha condições de pensar a dialética ao assumir a permissão do verde e o impedimento do vermelho como unidade, e dessa contradição simbólica conceber a ordenação do trânsito à ela externa, apesar de dela ser resultado. Tinha condições de pensar que dessa contradição ordenadora emergiam as condições para se sobreviver em um cruzamento, onde o desacordo se expressaria no violento choque de algum pára-choque contra seu fêmur.
    Não sabia juntar signos e formar palavras, muito menos extrair delas as ideias que constituem uma ordem de despejo; não detinha a habilidade comum às gentes ricas de elaborar falas repletas de argumentos ancorados em convenções sociais concretizadas pela mais sólida tinta preta impregnada nas folhas de papel do livro que detém em seu interior as normas que regem os passos daqueles que as conhecem e as desconhecem. E isso o oficial de justiça que, com meias palavras e três quartos de papel, gerou mais um sem teto pode constatar: “gente pobre e sem educação; que podem eles fazer senão ser esteira dos ricos?”. Pensava isso, pois sabia das intenções da ordem que carregava. Sabia do condomínio que seria construído pela empresa de capital aberto em cujas ações constavam não só o nome do juiz que assinou a ordem, como de grande parte dos funcionários públicos que trabalhavam no fórum. Não parece estranho pensar que a injustiça é essência da ordem que ora vivemos.
    Sinal verde. Fábio atravessa o cruzamento, vai para frente do fórum. Reflete o reflexo de si refletido nos olhos dos transeuntes que refletem a ordem através de suas roupas bem alinhadas, unhas e barbas feitas, cheiros não naturais e forma peculiar de perceber sem demonstrar. Tira de sua bolsa um tijolo envolvido num pedaço de papel grosseiro que antes envolvera seu café da manhã. Lança-os, pedra, papel e ira, em direção aos vidros espelhados do órgão público, e o som da explosão oca do vidro reverbera pelo ambiente aparentemente inócuo e racional. Um funcionário corre para averiguar o acontecido, vê o tijolo, o vidro quebrado, o papel-embrulho; abre o papel e vê apenas rabiscos. Nada entende. Fábio entendeu.

Cotidiano 1

          Pois é.
          Pararam por ali.
          Do beco tiririca sai só um.
E o outro?
              No momento virou carne encharcada.
              Depois vêm os abutres.
              Digerem a carne e cagam notícias.


   A merda é redigerida.
       Os famintos se saciam.
            Vomitam...
       ... na cara dos famintos que dão a carne comida.


                         Como é bom nosso lar!,
                         saber das coisas e poder ajudar os pobres enfurecidos por seu pouco conhecer.


                              E vomitam nos círculos comuns a lavagem ingerida por meio do alimento dos abutres.
                             
                              Como conhecemos, como conhecemos!


- Podemos ajudar?
- Sim.
- Como?
- Parem de comer e acabem convosco!

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Poema 2







Apalpado o movimento do breu que recai
pelas dezenove tantas horas ou mais
surte o som do estalo da brusca queda
do esparramado vazio lúmen de pedra.

Onde estamos, pergunta voz.
Eco.

Poema 1




ando às voltas com o como ser

                                          ser com quem ando

                                                                      de volta e meia num pé só

...

separei em ruas coisas di(zi)(vidi)das
juntei em pontes a soma

                                  preambulei ambulante bastante abastado da poesia derramando umas letras pelos                   cantos

                                  e os Cantos  sorveram cada som da esterilidade do símbolo do êmbolo das luzes
dos postes

                                                                    e carros

                                            e ômnibus

                e celulares.


abutre de noite não voa que morte não gosta de a toa



                                                               chega então o Sol,

e êmbolo inerte vida ganha.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Sobre a música "Morro do Pântano do Sul" - Festa da Cumieira

Moro num morro.
Lá mora um mouro.
Morro um pouco.








Deslizar-se-ia numa pia fosse a via.



Moro em fossa.
Navio ancoradouro.
Um pouco de morro.

Plantar-se-ia pântanos ao sul da face cinza.





Faço moradas no pântano do sul, do sul do anil, o pântano verde, verde anil, fossa fosse vista (...) vista-se e saia do pântano, dispa-se e nele entre, diáspora racional limítrofe do mental, a menta forte, tormenta. Um deslize às oitavas das primeiras segundas terceiras quintas sextas e nonas. Pântano hermetizado na viagem do ancoradouro geist gesticula um hino de fácil locução das notas dos instrumentos que buscam a sinapse interior cujo movimento conhece caminhos inéditos inauditos inacabados apenas começados. Saxofoniza-se neologismos, bateriza-se batiza à guiza de novos ritmos cordiais. A voz. A voz a palavra inexistente a diz de melhor jeito forma conteúdo. Sabe-se lá de mim quando subo ou desço ou simplesmente desloco-me no morro do pântano do sul, se lugar for. Espaço ou tempo. Um movimento entäusserung me acerta, entäusserung de cá também. Estranhamento não há. Bebo desse pântano como bebesse dum leite materno conhecido num plano apriorístico à la kant. Tente dele. Seus picos estouram retinas timpanos caixas toráxicas coração e espinha dorsal. (É aqui nessa minha flauta-vértebra atingida onde toco minha poesia control c control v - isso a quem convir. Pois na função da poesia pessoa - se é que há - justifico essa sandice.) Ao mover o corpo matéria no pântano do morro do pântano sul afunda-se, some-se, afoga-se, vislumbra-se a arte além. Clarinetes, senhoras e senhores, clarinetes!

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

menos de 15 min.

Em 15 min. escrevo o que vem à mente com o seguinte fim: escrever o que vem à mente.
É certo que existe a intenção da reativação do blog. Mas o escrever por escrever tem um quê de existencial, um quê de procura por alguma coisa nas coisas que parecem não ser coisas, parecem não oferecer nenhum significado, parecem ser pobres em si, mergulhadas em insignificância. Mas há um universo em cada formiga, em cada campainha. Há uma eternidade num segundo.
O espaço entre 1 e 2 é infinito. A composição de uma matéria de 1 mm contém milhares de coisas. Enfim.
O que se sabe das coisas insignificantes é que elas são tão cheias de significado que olhá-las com desdém chega a ser repulsivo.
É isso. E foi escrito em menos de 15 min., pois preciso cair fora.